(imagem retirada daqui)
Fiz, vinte anos aqui, casei por baixo da tília, de cabelo apanhado num rabo-decavalo.
Fiz, trinta anos aqui, e estive de barriga quatro vezes. Três bebés que cresceram, quase sem darmos por isso. E o outro, o bebé que não sobreviveu, está sepultado um pouco mais longe. Não pusemos flores no seu túmulo.
Fiz, quarenta anos aqui, um mundo para comandar com mão firme, sempre com um sorriso. E depois anos doces, o riso do meu homem, a sua calvície e as suas mãos atrevidas.
Fiz, cinquenta anos aqui, sem temer o amanhã.
Fiz, sessenta anos aqui, festejados num dia de tempestade, e setenta anos, o andar mais lento, sempre de mãos dadas com ele.
Fiz, oitenta anos aqui, o Henri desaparecera alguns meses antes e os filhos diziam-me “vira a página”.
Desde então, avanço quase caindo a cada passo, porque cada passo me afasta ainda mais dele.
Nada mais terei aqui, nenhuma festa, nenhuma queda, nenhuma noite de amor. Não voltarei a abrir as portadas pela fresca da manhã. Não voltarei a sentar-me, com um copo na mão, para contemplar o sol a pôr-se.
Vou-me embora.
Em “O Mergulho” de Séverine Vidal; Ilustração: Víctor L. Pinel, pág. 12